Valor de mercado é a quantia mais provável pela qual se negociaria voluntariamente e conscientemente um bem, em uma data de referência, dentro das condições do mercado vigente; esse é o conceito apresentado na introdução da NBR 14653-1:2019. Essa mesma norma técnica apresenta comentários sobre cada um dos elementos contidos nessa definição:

a) “quantia mais provável …” se refere ao preço expresso ou convertido em moeda corrente, que pode ser obtido pelo bem numa transação na qual as partes sejam independentes entre si e sem interesses especiais na transação. Esse valor exclui preços alterados por circunstâncias especiais, como financiamento atípico, arranjos especiais em permutas ou retrovendas;

b) “… pela qual se negociaria …” se refere ao fato de que o valor do bem é uma quantia estimada, e não o preço preestabelecido por uma das partes ou pelo qual a transação é finalmente realizada;

c) “… voluntariamente …” se refere à presunção de que cada parte está motivada para efetuar a transação, sem estar forçada a completá-la;

d) “… e conscientemente um bem …” se refere à presunção de que as partes são conhecedoras das condições do bem e do mercado em que está inserido;

e) “… numa data de referência …” indica que o valor de mercado estimado está referido a uma data e, portanto, pode variar ao longo do tempo. A eventual mudança das condições de mercado pode conduzir a um valor diferente, em outra data;

f) “… dentro das condições do mercado vigente …” significa que o valor reflete as condições da estrutura, da conjuntura, da conduta e do desempenho do mercado na data de referência da avaliação. Entre essas condições está o tempo de exposição do bem no mercado, que pode ser suficiente, de acordo com as suas especificidades, para chamar a atenção de interessados e atingir o preço mais representativo nas condições do mercado.

Na doutrina, encontra-se conceito semelhante:

O valor de mercado é um valor bi-lateral por sua natureza, porque implica a existência de um vendedor e de um comprador em um mercado que abrange a grande maioria dos vendedores e compradores de determinadas coisas. As coisas de interesse de limitado número de pessoas ou de grupo de pessoas, não são causa do valor de mercado. […] Dois avaliadores igualmente dotados e idôneos só excepcionalmente encontrarão um mesmo valor único para uma coisa ou imóvel, e isto acontece precisamente por causa dos fatores psicológicos determinantes do valor que são diferentemente apreciados por cada um deles, sem que esses resultados divergentes prejudiquem qualquer das duas avaliações. Cada um dos avaliadores terá seus justos e fundamentados motivos para chegar à conclusão que externar (BERRINI, 1960, p. 29).

 

O valor de mercado de um bem é único, quaisquer que sejam os fins para os quais se faz a avaliação.  Trata-se de um conceito abstrato; no processo de avaliação o que se busca é aproximar-se o mais possível desse valor. Sobre esse tema, temos a posição de Pellegrino:

Infere-se, por conseguinte, que não cabe ao avaliador, quando efetua um trabalho de avaliação de imóvel, indagar sobre a finalidade do trabalho, a não ser que tal esclarecimento sirva para determinar tão somente o grau de precisão da avaliação.

Isto posto, ainda que nos livros de engenharia econômica, de engenharia de avaliações ou mesmo de economia se encontrem referências a diversos tipos de valores – valor de mercado, valor fiscal, valor de contabilidade, valor de uso, valor físico, valor intrínseco, valor de venda, valor de desapropriação, valor histórico, valor sentimental e inúmeros outros – não se admite que um determinado bem possa ter mais de um valor expressando o real valor de mercado, o qual pode ser definido como o preço que o imóvel avaliando poderia alcançar quando colocado à venda em prazo razoável, com o vendedor desejando mas não estando obrigado a vendê-lo e o comprador adquirindo-o com inteiro conhecimento de todos os usos e finalidades para os quais está adaptado e poderá ser utilizado, sem contudo estar compelido à compra; em outras palavras, corresponderia ao preço obtido através de uma livre compra e venda à vista (PELLEGRINO, 1983, p. 17).

 

Porém, nem todas as operações imobiliárias podem ser consideradas úteis para se estimar o valor de mercado; as informações contidas em operações anômalas devem ser rejeitadas; dentre essas operações, podemos citar algumas que já foram identificadas na doutrina (BERRINI, 1960, p. 29):

transmissões de propriedade provenientes de desapropriações amigáveis ou judiciais, por ocorrer nas mesmas a circunstância de serem compulsórias, onde o vendedor não tem o direito de recusa, e o comprador ser único, sem concorrentes;

transmissões inter-vivos, provenientes de doações entre parentes, pois há sempre a tendência de serem feitas por preços inferiores ao do valor provável, com o objetivo de se reduzir o imposto que devem pagar; ou por falta de uma estimativa fundamentada do valor do imóvel;

transmissões causa-mortis, onde, em geral, as avaliações dos imóveis são, por consenso geral, ou toleradamente, feitas por preços inferiores aos prováveis, com o fito de se reduzirem os pagamentos dos impostos devidos por herança;

transmissões realizadas entre pessoas residentes e não residentes, ou entre pessoas não residentes, porque em regra geral as pessoas não residentes desconhecem as condições econômicas locais e a capacidade de renda do imóvel que vão comprar ou vender, fato que torna duvidoso o valor da transmissão;

transmissões entre uma sociedade anônima e a maioria de seus acionistas, onde ficam confundidas em uma só entidade, as entidades distintas, do vendedor e do comprador, fato que as torna enfermas como representativas do valor;

vendas em hasta pública, que também são vendas compulsórias, onde não entram em ação livres as forças econômicas, e onde o preço da venda é recebido, não pelo proprietário, mas pelo credor;

transmissões entre credor e devedor, por acordo mútuo, ou por executivo hipotecário ou pignoratício, porque, por mais liberal que seja um credor, o devedor tem a sua vontade cerceada pela obrigada de liquidar o débito, no caso de acordo, e no caso de executivo hipotecário por ser venda em hasta pública, onde a vontade do proprietário não se pode fazer sentida, e em ambos os casos por o preço da venda não ser recebido pelo proprietário;

transmissões e desapropriações entre os concessionários de serviços públicos e o poder expropriante, o qual muitas vezes também é o outorgante da concessão da exploração dos serviços públicos, existindo então um duplo constrangimento, vlz., a falta de liberdade para recusar, e o desejo, por vezes consciente e por vezes inconsciente, do concessionário do serviço procurar afagar a boa vontade do poder outorgante da concessão, quer direta, quer indiretamente, para a obtenção de novos favores, ou de maior tolerância

 

Welch (1960, p. 29) ainda cita as seguintes situações:

Transmissões entre parentes. O preço em tais transmissões é muitas vezes governado por motivos não econômicos; pode ser ou muito baixo ou muito alto, geralmente o primeiro.

Transmissões entre companhias interrelacionadas, ou entre as companhias e a maioria dos acionistas.

Transmissões entre uma pessoa residente e outra não-residente, ou entre duas não-residentes. As não-residentes estão sujeitas a se acharem parcamente informadas no que se refere à propriedade, especialmente os compradores não-residentes.

Transmissões por vencimentos de taxas ou outros ônus, abaixo do valor de mercado. De qualquer forma, tais vendas estão sujeitas a serem altamente desnorteadas.

Transmissões em que o outorgado é também o credor hipotecário, especialmente quando a hipoteca é grande relativamente ao preço. Tais transmissões são muitas vezes consumadas para evitarem os executivos hipotecários.

Transmissões resultantes de necessidades especiais do outorgante ou do outorgado. Vendas realizadas para satisfazer débitos prementes do outorgante, ou compras de terrenos adjacentes necessários para o aproveitamento apropriado de um parcela já de propriedade do outorgado, ilustram este tipo de transmissão.

Transmissões feitas pelos processos de desapropriação, ou sob a ameaça de ação de desapropriação. O preço nestes casos pode ser muito alto por causa da tendência dos juris, nos casos de desapropriação, de darem vereditos liberais. Propriedades extremamente valiosas, de outro lado, poderão ser transmitadas por menos do que valem por motivo da não familiaridade do jurado médio, com tais propriedades.

 

As espécies relacionadas acima não excluem a possibilidade de se encontrarem outras; portanto, cabe ao avaliador analisar com cautela os dados coletados em sua pesquisa de mercado.

Ainda que o avaliador decida fundamentar sua avaliação em valores tabelados em normas fiscais, é necessário que se faça uma pesquisa no mercado, pois, via de regra, o valor fiscal é apenas o valor que as autoridades competentes atribuem ao bem unicamente para fins de tributação (ITR, IPTU, ITCMD, ITBI) e, isoladamente, ele  não serve como base de cálculo para a avaliação (MEIRELLES, 2011, p. 394); portanto, não se deve confundir valor de mercado com valor fiscal.

 

 

Fontes:
SILVA, O. J. P. Vocabulário jurídico 22. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003.
BERRINI, L. C. Avaliações de imóveis. 4. ed. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos S.A., 1960.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de construir. 10. ed. atualizada por Adilson Abreu Dallari, Daniela Libório di Sarno, Luiz Guilherme da Costa Wagner Jr e Mariana Novis. São Paulo: Malheiros Editores, 2011.
PELLEGRINO, J. C. Avaliação de propriedades rurais. In: Avaliações para garantias. São Paulo: Pini, 1983.
WELCH, Ronald B. A avaliação de terrenos. Tradutor Luiz Carlos Berrini. São Paulo: Publicado pelo tradutor, 1946.