O conceito de avaliação pericial de bens, de seus frutos e direitos é apresentado no item 02 da Introdução da NBR 14653-1:2019, qual seja: análise técnica para identificar valores, custos ou indicadores de viabilidade econômica, para um determinado objetivo, finalidade e data, consideradas determinadas premissas, ressalvas e condições limitantes claramente explicitadas. Esses são os elementos do conceito.
Por análise, compreende-se o exame feito em uma coisa ou fato com objetivo de se conhecer sua natureza, sua constituição, seus princípios. Os elementos “valor”, “custo” e “indicador de viabilidade econômica” remetem o avaliador à realidade do mercado, o que será feito durante a pesquisa para coleta de dados. Os demais elementos estão relacionados às especificidades da avaliação no caso concreto.
Entretanto, é necessário que se dê especial atenção ao qualificativo “técnica”, cujo conceito podemos encontrar na doutrina jurídica:
Técnica. Forma feminina de técnico, do grego technikos, de techné (arte), entende-se, propriamente, o processo ou o procedimento, que é seguido segundo as regras da arte, ou consoante os preceitos emanados da ciência. Assim, o que é feito dentro da técnica está conforme às regras da arte, ou obedece aos princípios instituídos pela ciência. Praticamente, a técnica resulta num sistema, que serve de forma ao procedimento, ou estrutura à parte material de uma arte, indicando a perícia, ou a habilidade, que se deve empregar na execução de certo mister. E, por essa razão, a técnica sempre indica o conjunto de regras, ou de preceitos, que devem ser seguidos, ou atendidos, na execução de qualquer coisa, que está adstrita ou se cinja à arte ou à ciência. Cada arte, ou cada ciência, pois, possui a sua técnica, a ser aplicada na realização de quaisquer fatos, que lhe sejam pertinentes (DE PLÁCIDO E SILVA, 2003, p. 1.368).
Desse modo, por ser uma atividade técnica, submetida a regras e princípios, no âmbito da avaliação pericial não existe espaço nem para o subjetivismo irrestrito nem para as afirmações infundadas. Todavia, isso não significa que o avaliador se encontre preso nos limites de uma estrutura imutável. Conforme será visto no desenvolvimento deste trabalho, em diversos momentos do processo de avaliação, caberá ao avaliador a prerrogativa exclusiva para tomar decisões e são essas decisões que imprimirão movimento e sentido a todo o processo; exige-se, porém, que essas decisões sejam fundamentadas na fonte das normas técnicas ou da doutrina consagrada na área e, ainda, que não se distanciem da realidade do mercado da situação do bem.
Princípios gerais da avaliação de bens
A NBR 14653-1:2019 elenca os princípios geralmente considerados e aceitos, conforme a natureza do bem, o objetivo e a finalidade da avaliação:
a) lei da oferta e da procura: observados isoladamente estes dois aspectos, o preço de um bem diminui com o aumento da sua oferta e cresce com o aumento da sua procura;
b) princípio da semelhança: em uma mesma data, dois bens semelhantes, em mercados semelhantes, têm valores semelhantes;
c) princípio da proporcionalidade: as diferenças de valor são proporcionais às diferenças das características relevantes dos bens;
d) princípio da substituição: um bem pode substituir outro considerando-se aspectos como utilidade, destinação, funcionalidade, durabilidade, características tecnológicas, desempenho técnico e econômico;
e) princípio da rentabilidade: o valor de um bem, passível de exploração econômica, é função da renda que previsivelmente proporciona;
f) princípio do maior e melhor uso: o valor de um bem que comporta diferentes usos e aproveitamentos é o que resulta economicamente de maneira mais eficiente, consideradas as suas possibilidades legais, físicas e mercadológicas;
g) princípio da exequibilidade: quando existirem vários cenários ou possibilidades, são adotados os mais viáveis.
Conceitos
Este texto utilizou os termos técnicos da área; portanto, visando à sua melhor compreensão, transcreveremos a seguir alguns dos principais conceitos apresentados nas normas técnicas.
A NBR 14653 apresenta os conceitos dos termos amplamente utilizados na área de avaliação de bens.
Na NBR 14653-1:2019 encontramos os seguintes conceitos:
acessório: bem que se incorpora ao principal e que possui valor isoladamente, incorporado ou não a ele.
amostra: conjunto de dados representativos de uma população.
amostragem: procedimento utilizado para constituir uma amostra.
arrendamento: retribuição pela cessão de direito à exploração, uso ou fruição de um bem capaz de produzir frutos, por prazo certo e condições convencionadas.
avaliação de bens, de seus frutos e direitos: análise técnica para identificar valores, custos ou indicadores de viabilidade econômica, para um determinado objetivo, finalidade e data, consideradas determinadas premissas, ressalvas e condições limitantes.
benefícios e despesas indiretas (BDI): acréscimo sobre o custo direto da obra ou serviço, representativo do lucro do construtor, das despesas indiretas e dos impostos.
bem: coisa que tem valor, suscetível de utilização ou que pode ser objeto de direito, que integra um patrimônio.
bem tangível: bem identificado materialmente (por exemplo, imóveis, equipamentos, matérias-primas).
bem intangível: bem não identificado materialmente (por exemplo, fundo de comércio, marcas e patentes).
benfeitoria: resultado de obra ou serviço realizado em um bem e que não pode ser retirado sem destruição, fratura ou dano.
benfeitoria necessária: benfeitoria indispensável para conservar o bem ou evitar a sua deterioração.
benfeitoria útil: benfeitoria que aumenta ou facilita o seu uso, embora possa ser dispensável.
benfeitoria voluptuária: benfeitoria que visa simples deleite ou recreio, sem aumentar o uso normal do bem.
campo de arbítrio: intervalo de variação no entorno do estimador pontual adotado na avaliação, dentro do qual pode-se arbitrar o valor do bem, desde que justificado pela existência de características próprias não contempladas no modelo.
comprador especial: adquirente que possui vantagens ou interesses específicos em relação a um bem ou direito, não relevantes para outros participantes do mercado.
custo: total dos gastos diretos e indiretos necessários à produção, manutenção ou aquisição de um bem, em uma determinada data e situação.
custo de reedição: custo de reprodução, descontada a depreciação do bem, tendo em vista o estado em que se encontra.
custo de reprodução: custo necessário para reproduzir um bem idêntico, com a consideração dos seus insumos pertinentes, sem considerar eventual depreciação.
custo de substituição: custo de reedição de um bem, com a mesma utilidade e características assemelhadas ao avaliando.
dado de mercado: elemento ou informação disponível em determinado mercado, com as suas respectivas características.
depreciação: perda de valor de um bem, devido a modificações em seu estado ou qualidade, ocasionadas pelo descrito em 3.1.14.1 a 3.1.14.4.
3.1.14.1 decrepitude: desgaste de suas partes constitutivas, em consequência de seu envelhecimento natural, em condições normais de utilização e manutenção.
3.1.14.2 deterioração: desgaste de seus componentes em razão de uso ou manutenção inadequados.
3.1.14.3 mutilação: retirada de sistemas ou componentes originalmente existentes.
3.1.14.4 obsoletismo: superação tecnológica ou funcional.
empreendimento: conjunto de bens capaz de produzir receitas por meio de comercialização ou exploração econômica, podendo ser imobiliário (por exemplo, loteamento, prédios comerciais/residenciais), de base imobiliária (por exemplo, hotel, shopping center, parques temáticos), industrial ou rural.
hipótese nula em um modelo de regressão: hipótese de que uma ou um conjunto de variáveis independentes envolvidas no modelo de regressão não é importante para explicar a variação do fenômeno, a um nível de significância preestabelecido.
homogeneização: tratamento dos preços observados, mediante a aplicação de transformações matemáticas que expressem, em termos relativos, as diferenças entre os atributos dos dados de mercado e os do bem avaliando.
imóvel: bem constituído de terreno e eventuais benfeitorias a ele incorporadas.
inferência estatística: parte da ciência estatística que permite extrair conclusões sobre a população a partir de amostra.
infraestrutura: conjunto de obras e serviços que dá suporte às atividades econômicas e sociais ou à utilização de um bem.
instalação: conjunto de aparelhos, peças ou dispositivos necessários ou acessórios à utilização de um bem.
laudo de avaliação: relatório com fundamentação técnica e científica, elaborado por profissional da engenharia de avaliações, em conformidade com esta ABNT NBR 14653, para avaliar o bem.
memória de cálculo: demonstrativo dos procedimentos utilizados para a obtenção dos resultados da avaliação.
modelo: representação técnica da realidade.
modelo de regressão: modelo utilizado para representar determinado fenômeno ou comportamento considerando-se as diversas características que possam influenciá-los.
nível de significância: probabilidade de rejeitar a hipótese nula, quando ela for verdadeira.
pesquisa: conjunto de atividades de identificação, investigação, coleta e seleção dos dados de mercado.
população: totalidade de dados do segmento que se pretende analisar.
preço: é uma expressão monetária que define uma transação de um bem, de seu fruto, de um direito, ou da expectativa de sua transação.
recurso ambiental: recurso natural necessário à existência e preservação da vida.
situação paradigma: situação hipotética ou virtual, adotada como referencial para avaliação de um bem.
taxa de desconto: taxa adotada para o cálculo do valor presente de uma despesa ou receita futura.
tratamento de dados: aplicação de operações que expressem, em termos relativos, as diferenças de atributos entre os dados de mercado e os do bem avaliando.
valor de mercado: quantia mais provável pela qual se negociaria voluntária e conscientemente um bem, em uma data de referência, dentro das condições do mercado vigente.
valor econômico: valor presente da renda liquida auferível pelo empreendimento, durante sua vida econômica, a uma taxa de desconto correspondente ao custo de oportunidade, considerados cenários previsíveis sob condições de risco.
valor depreciável: diferença entre o valor do bem na condição de novo e o seu valor residual.
valor de indenização: valor atribuído a danos, perdas ou prejuízos provocados, referido a uma determinada data.
valor residual: valor do bem ao final de sua vida útil ou de seu horizonte projetivo.
vantagem da coisa feita: diferença entre o valor de mercado e o custo de reedição de um bem, quando positiva.
vida econômica: prazo econômico operacional de um bem.
vida útil: prazo de utilização funcional de um bem.
vida remanescente: vida que resta a um bem.
vistoria: constatação local, presencial, de fatos e aspectos, mediante observações criteriosas em um bem e nos elementos e condições que o constituem ou o influenciam.
A NBR 14653-3:2019 traz os seguintes conceitos:
aproveitamento eficiente: aquele recomendável e tecnicamente possível para o local, em uma data de referência, observada a atual e efetiva tendência mercadológica nas circunvizinhanças, entre os diversos usos permitidos pela legislação vigente;
ativo ambiental: conjunto de atributos e funções ambientais que representam benefícios economicamente valoráveis.
benfeitorias: resultado de obra ou serviço realizado no imóvel rural.
benfeitorias não reprodutivas: benfeitorias que não geram renda diretamente (exemplos: edificações, terreiros, estradas e acessos, cercas, sistemas de drenagem e irrigação por gravidade, obras e trabalhos de melhorias das terras).
benfeitorias reprodutivas: benfeitorias que geram renda diretamente (exemplos: culturas, florestas plantadas, pastagens cultivadas e pastagens nativas melhoradas).
contemporaneidade: característica de dados coletados em período de tempo onde não houve variação significativa de valor no mercado imobiliário do qual fazem parte. Esse período de tempo é decidido pelo profissional da engenharia de avaliações, conforme seu conhecimento do mercado.
cultura de ciclo curto: cultura com ciclo igual ou inferior a um ano.
cultura de ciclo longo: cultura com ciclo superior a um ano.
custo de formação: quantia gasta para o preparo do solo e implantação até a primeira safra ou pastoreio.
custo de manutenção: quantia gasta com os tratos culturais.
custo de oportunidade do capital: maior taxa de juros auferível no mercado em outras oportunidades de investimento concorrentes, em termos de montante investido e prazo, a um dado nível de risco.
equipamentos: insumos destinados à exploração da terra, à irrigação, à defesa fitossanitária, à correção e fertilização, ao processamento da produção, à circulação e aos transportes, compreendendo máquinas industriais fixas, máquinas agrícolas e implementos, conjuntos de irrigação, de fertilização e de drenagem, animais de trabalho, veículos e outros.
floresta plantada: floresta formada para fins comerciais ou industriais.
imóvel rural: imóvel rústico de área contínua, qualquer que seja sua localização, que se destine à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal, agroindustrial ou aqueles destinados à proteção e preservação ambiental.
obras e trabalhos de melhoria do solo: obras e trabalhos de conservação, proteção e de correção de deficiências do solo, visando ao seu melhor aproveitamento e à otimização da capacidade de produção.
passivo ambiental: obrigações economicamente valoráveis, decorrentes de danos ambientais ou da inobservância da legislação ambiental.
recursos naturais: recursos de que o solo se acha dotado naturalmente, sem custo de produção, mas constituindo bens econômicos, compreendendo florestas nativas e pastagens naturais, águas e materiais de lavra, como argilas, areias e rochas.
situação do imóvel: localização em relação a um centro de referência e o tipo de acesso, do ponto de vista legal e de trafegabilidade.
terra bruta: terra onde existe vegetação natural em seu estado original ou em estágio regenerativo.
terra cultivada: terra com cultivo agrícola ou em pousio.
terra nua: terra sem a consideração de benfeitorias.
valor da terra nua: diferença entre o valor total do imóvel e o valor de suas benfeitorias, considerada, quando for o caso, a existência de passivos ou ativos ambientais.
valor econômico: valor presente da renda liquida auferível pelo empreendimento ou pela produção agrossilvopastoril, durante sua vida econômica, a uma taxa de desconto correspondente ao custo de oportunidade de igual risco.
Valor, preço e custo
A NBR 14653-1:2019 esclarece, em sua introdução, que os conceitos de valor, preço e custo são distintos, apresentando-os.
O valor de um bem decorre de várias características, entre as quais se destacam sua raridade e sua utilidade para satisfazer necessidades e interesses humanos e sofre influências por suas características singulares e condições de oferta e procura. Trata-se de um conceito econômico abstrato e não de um fato.
O preço é uma expressão monetária que define uma transação de um bem, de seu fruto, de um direito, ou da expectativa de sua transação. O preço é um fato relacionado às capacidades financeiras, às motivações ou aos interesses específicos do comprador ou do vendedor.
O custo tem relação com o total dos gastos diretos e indiretos necessários à produção ou aquisição de um bem, fruto ou direito.
Valor de mercado
Valor de mercado é a quantia mais provável pela qual se negociaria voluntariamente e conscientemente um bem, em uma data de referência, dentro das condições do mercado vigente; esse é o conceito apresentado na introdução da NBR 14653-1:2019. Essa mesma norma técnica apresenta comentários sobre cada um dos elementos contidos nessa definição:
a) “quantia mais provável …” se refere ao preço expresso ou convertido em moeda corrente, que pode ser obtido pelo bem numa transação na qual as partes sejam independentes entre si e sem interesses especiais na transação. Esse valor exclui preços alterados por circunstâncias especiais, como financiamento atípico, arranjos especiais em permutas ou retrovendas;
b) “… pela qual se negociaria …” se refere ao fato de que o valor do bem é uma quantia estimada, e não o preço preestabelecido por uma das partes ou pelo qual a transação é finalmente realizada;
c) “… voluntariamente …” se refere à presunção de que cada parte está motivada para efetuar a transação, sem estar forçada a completá-la;
d) “… e conscientemente um bem …” se refere à presunção de que as partes são conhecedoras das condições do bem e do mercado em que está inserido;
e) “… numa data de referência …” indica que o valor de mercado estimado está referido a uma data e, portanto, pode variar ao longo do tempo. A eventual mudança das condições de mercado pode conduzir a um valor diferente, em outra data;
f) “… dentro das condições do mercado vigente …” significa que o valor reflete as condições da estrutura, da conjuntura, da conduta e do desempenho do mercado na data de referência da avaliação. Entre essas condições está o tempo de exposição do bem no mercado, que pode ser suficiente, de acordo com as suas especificidades, para chamar a atenção de interessados e atingir o preço mais representativo nas condições do mercado.
Na doutrina, encontra-se conceito semelhante:
O valor de mercado é um valor bi-lateral por sua natureza, porque implica a existência de um vendedor e de um comprador em um mercado que abrange a grande maioria dos vendedores e compradores de determinadas coisas. As coisas de interesse de limitado número de pessoas ou de grupo de pessoas, não são causa do valor de mercado. […] Dois avaliadores igualmente dotados e idôneos só excepcionalmente encontrarão um mesmo valor único para uma coisa ou imóvel, e isto acontece precisamente por causa dos fatores psicológicos determinantes do valor que são diferentemente apreciados por cada um deles, sem que esses resultados divergentes prejudiquem qualquer das duas avaliações. Cada um dos avaliadores terá seus justos e fundamentados motivos para chegar à conclusão que externar (BERRINI, 1960, p. 29).
O valor de mercado de um bem é único, quaisquer que sejam os fins para os quais se faz a avaliação. Trata-se de um conceito abstrato; no processo de avaliação o que se busca é aproximar-se o mais possível desse valor. Sobre esse tema, temos a posição de Pellegrino:
Infere-se, por conseguinte, que não cabe ao avaliador, quando efetua um trabalho de avaliação de imóvel, indagar sobre a finalidade do trabalho, a não ser que tal esclarecimento sirva para determinar tão somente o grau de precisão da avaliação.
Isto posto, ainda que nos livros de engenharia econômica, de engenharia de avaliações ou mesmo de economia se encontrem referências a diversos tipos de valores – valor de mercado, valor fiscal, valor de contabilidade, valor de uso, valor físico, valor intrínseco, valor de venda, valor de desapropriação, valor histórico, valor sentimental e inúmeros outros – não se admite que um determinado bem possa ter mais de um valor expressando o real valor de mercado, o qual pode ser definido como o preço que o imóvel avaliando poderia alcançar quando colocado à venda em prazo razoável, com o vendedor desejando mas não estando obrigado a vendê-lo e o comprador adquirindo-o com inteiro conhecimento de todos os usos e finalidades para os quais está adaptado e poderá ser utilizado, sem contudo estar compelido à compra; em outras palavras, corresponderia ao preço obtido através de uma livre compra e venda à vista (PELLEGRINO, 1983, p. 17).
Porém, nem todas as operações imobiliárias podem ser consideradas úteis para se estimar o valor de mercado; as informações contidas em operações anômalas devem ser rejeitadas; dentre essas operações, podemos citar algumas que já foram identificadas na doutrina (BERRINI, 1960, p. 29):
transmissões de propriedade provenientes de desapropriações amigáveis ou judiciais, por ocorrer nas mesmas a circunstância de serem compulsórias, onde o vendedor não tem o direito de recusa, e o comprador ser único, sem concorrentes;
transmissões inter-vivos, provenientes de doações entre parentes, pois há sempre a tendência de serem feitas por preços inferiores ao do valor provável, com o objetivo de se reduzir o imposto que devem pagar; ou por falta de uma estimativa fundamentada do valor do imóvel;
transmissões causa-mortis, onde, em geral, as avaliações dos imóveis são, por consenso geral, ou toleradamente, feitas por preços inferiores aos prováveis, com o fito de se reduzirem os pagamentos dos impostos devidos por herança;
transmissões realizadas entre pessoas residentes e não residentes, ou entre pessoas não residentes, porque em regra geral as pessoas não residentes desconhecem as condições econômicas locais e a capacidade de renda do imóvel que vão comprar ou vender, fato que torna duvidoso o valor da transmissão;
transmissões entre uma sociedade anônima e a maioria de seus acionistas, onde ficam confundidas em uma só entidade, as entidades distintas, do vendedor e do comprador, fato que as torna enfermas como representativas do valor;
vendas em hasta pública, que também são vendas compulsórias, onde não entram em ação livres as forças econômicas, e onde o preço da venda é recebido, não pelo proprietário, mas pelo credor;
transmissões entre credor e devedor, por acordo mútuo, ou por executivo hipotecário ou pignoratício, porque, por mais liberal que seja um credor, o devedor tem a sua vontade cerceada pela obrigada de liquidar o débito, no caso de acordo, e no caso de executivo hipotecário por ser venda em hasta pública, onde a vontade do proprietário não se pode fazer sentida, e em ambos os casos por o preço da venda não ser recebido pelo proprietário;
transmissões e desapropriações entre os concessionários de serviços públicos e o poder expropriante, o qual muitas vezes também é o outorgante da concessão da exploração dos serviços públicos, existindo então um duplo constrangimento, viz., a falta de liberdade para recusar, e o desejo, por vezes consciente e por vezes inconsciente, do concessionário do serviço procurar afagar a boa vontade do poder outorgante da concessão, quer direta, quer indiretamente, para a obtenção de novos favores, ou de maior tolerância
Welch (1960, p. 29) ainda cita as seguintes situações:
Transmissões entre parentes. O preço em tais transmissões é muitas vezes governado por motivos não econômicos; pode ser ou muito baixo ou muito alto, geralmente o primeiro.
Transmissões entre companhias interrelacionadas, ou entre as companhias e a maioria dos acionistas.
Transmissões entre uma pessoa residente e outra não-residente, ou entre duas não-residentes. As não-residentes estão sujeitas a se acharem parcamente informadas no que se refere à propriedade, especialmente os compradores não-residentes.
Transmissões por vencimentos de taxas ou outros ônus, abaixo do valor de mercado. De qualquer forma, tais vendas estão sujeitas a serem altamente desnorteadas.
Transmissões em que o outorgado é também o credor hipotecário, especialmente quando a hipoteca é grande relativamente ao preço. Tais transmissões são muitas vezes consumadas para evitarem os executivos hipotecários.
Transmissões resultantes de necessidades especiais do outorgante ou do outorgado. Vendas realizadas para satisfazer débitos prementes do outorgante, ou compras de terrenos adjacentes necessários para o aproveitamento apropriado de um parcela já de propriedade do outorgado, ilustram este tipo de transmissão.
Transmissões feitas pelos processos de desapropriação, ou sob a ameaça de ação de desapropriação. O preço nestes casos pode ser muito alto por causa da tendência dos juris, nos casos de desapropriação, de darem vereditos liberais. Propriedades extremamente valiosas, de outro lado, poderão ser transmitidas por menos do que valem por motivo da não familiaridade do jurado médio, com tais propriedades.
As espécies relacionadas acima não excluem a possibilidade de se encontrarem outras; portanto, cabe ao avaliador analisar com cautela os dados coletados em sua pesquisa de mercado.
Ainda que o avaliador decida fundamentar sua avaliação em valores tabelados em normas fiscais, é necessário que se faça uma pesquisa no mercado, pois, via de regra, o valor fiscal é apenas o valor que as autoridades competentes atribuem ao bem unicamente para fins de tributação (ITR, IPTU, ITCMD, ITBI) e, isoladamente, ele não serve como base de cálculo para a avaliação (Meirelles, 2011, p. 394); portanto, não se deve confundir valor de mercado com valor fiscal.
Caso o avaliador decida utilizar informações disponibilizadas por órgãos governamentais, recomenda-se que pesquise qual foi a metodologia utilizada para a confecção dos relatórios de valor da terra nua e justifique a sua escolha. Dentre esses órgãos podemos citar, sem a exclusão de outros:
INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária.
EMATER Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural.
IEA Instituto de Economia Agrícola, vinculado à Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo;
Receita Federal, que divulga anualmente as planilhas para cálculo do imposto sobre propriedade rural (ITR).
O uso de valores já estabelecidos não dispensa o avaliador de pesquisar o mercado.
Fontes:
SILVA, O. J. P. Vocabulário jurídico 22. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003.
BERRINI, L. C. Avaliações de imóveis. 4. ed. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos S.A., 1960.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de construir. 10. ed. atualizada por Adilson Abreu Dallari, Daniela Libório di Sarno, Luiz Guilherme da Costa Wagner Jr e Mariana Novis. São Paulo: Malheiros Editores, 2011.
PELLEGRINO, J. C. Avaliação de propriedades rurais. In: Avaliações para garantias. São Paulo: Pini, 1983.
WELCH, Ronald B. A avaliação de terrenos. Tradutor Luiz Carlos Berrini. São Paulo: Publicado pelo tradutor, 1946.