A NBR 14653-3:2019, em seu item 10.8.1, apresenta o método comparativo direto de dados de mercado como sendo aquele em que o valor do imóvel é obtido por meio de modelos onde as características dos imóveis, como por exemplo, topografia, salubridade, inclinação, consistência do solo, testada, profundidade, frentes múltiplas, forma de pagamento, localização, área, tipos de solos, benfeitorias, equipamentos, recursos naturais etc., são consideradas variáveis independentes, ou seja, variáveis que dão conteúdo lógico e que são capazes de explicar a variação dos preços observada no mercado onde foram coletados os dados que compõem a amostra; por tal motivo, essas variáveis também são conhecidas na doutrina como variáveis explicativas.
Segundo o item 7.2.1 da NBR 14653-1:2019, que trata dos procedimentos gerais, o método comparativo direto de dados de mercado identifica o valor do bem por meio de tratamento técnico dos atributos dos elementos comparáveis constituintes da amostra. A existência de dados de mercado comparáveis e, também, o tamanho da amostra são condicionantes para a aplicação do método comparativo direto de dados de mercado.
A especificação da avaliação e o enquadramento do laudo em um dos três graus de precisão e de fundamentação são tratados no item 9 da NBR 14653-3:2019. A especificação da avaliação está diretamente relacionada tanto com o empenho do avaliador quanto com o conjunto de informações extraídas do mercado (item 9.1.1 da mesma norma).
Existem observações específicas para a avaliação de benfeitorias (item 9.2), para a identificação do valor do imóvel ou do valor da terra nua com modelos de regressão linear (item 9.3.1, tabela 2)
As diretrizes da NBR 14653-3:2019 devem ser aplicadas com prioridade; todavia, subsidiariamente, em caso de lacuna e desde que haja compatibilidade com as normas específicas, podem ser aplicadas as diretrizes dos procedimentos gerais previstos nas outras partes da NBR 14653.
Muito embora, em se tratando da avaliação da terra nua, o método comparativo direto de dados de mercado tenha uma preferência sobre os demais (itens 10.1.1 da NBR 14653-3:2019), essa orientação não é absoluta, cabendo exclusivamente ao avaliador a prerrogativa de decidir se esse é o método mais adequado para a avaliação do bem no caso em concreto, principalmente se não forem encontrados dados confiáveis para compor a amostra.
Um roteiro simplificado para a aplicação do método comparativo direto de dados de mercado é apresentado a seguir.
- Vistoria do bem avaliando.
- Pesquisa de mercado e coleta de dados.
- Existência de dados;
- Tamanho da amostra;
- Tratamento dos dados por fatores de homogeneização:
- Ajuste prévio dos valores pelo fator de fonte;
- Testes de semelhança por intervalo de admissibilidade;
- teste dos fatores individualmente considerados;
- teste do conjunto de fatores.
- Aplicação dos fatores na forma de somatório;
- Saneamento dos dados:
- intervalo de 30% em torno da média;
- critério de Chauvenet;
- critério de Arley.
- Cálculo do coeficiente de variação;
- Limites de extrapolação admissíveis;
- Cálculo do intervalo de confiança, grau de precisão e campo de arbítrio;
- Avaliação;
- Arredondamento
- Tratamento dos dados por modelo de regressão linear:
- Ajuste prévio dos dados pelo fator de fonte;
- Identificação das variáveis independentes relevantes:
- Análise da correlação entre as variáveis (conhecimento dos efeitos da variável sobre os preços no mercado);
- Transformação das variáveis, dependendo da correlação observada;
- Análise dos dados pelo programa compatível;
- Análise dos níveis de significância dos resultados:
- nível de significância do modelo (ensaio F de Snedecor);
- nível de significância dos coeficientes regressores (teste t de Student);
- Análise de normalidade;
- Análise de homocedasticidade (teste de Koenker-Bassett);
- Análise de multicolinearidade;
- Análise de autocorrelação (teste de Durbin-Watson);
- Escolha do modelo matemático.
- Avaliação;
- Arredondamento
- tratamento dos dados pelas notas agronômicas (imóvel rural apenas).
- cálculo da nota agronômica específica do bem avaliando;
- homogeneização da amostra pelas notas agronômicas dos dados coletados no mercado.
A avaliação realizada com o auxílio das notas agronômicas será apresentada em página própria; após a etapa de homogeneização, o procedimento retoma as etapas gerais acima apresentadas.
A nota agronômica do imóvel pode, ainda, ser utilizada como variável independente tanto na fase de homogeneização por fatores quanto no modelo de análise de dados por regressão linear simples ou múltipla.
Além dos requisitos mínimos apresentados acima, o avaliador pode incluir etapas que entender úteis para justificar a sua estimativa de valor.
Cabe ao avaliador escolher por que caminho fará o tratamento dos dados coletados: por fatores de homogeneização, por modelo de regressão linear ou pela nota agronômica. Todos esses procedimentos são válidos; entretanto, não raro eles apresentarão resultados diferentes uns dos outros, cabendo ao avaliador decidir qual deles será usado para embasar sua estimativa.
Pesquisa de mercado e coleta de dados
Cabe exclusivamente ao avaliador pesquisar a dinâmica e as práticas de mercado adotadas na região em que se situa o bem avaliando. Não existe número máximo de observações coletadas no mercado; pelo contrário, quanto maior for a quantidade de dados coletados, maiores serão as chances de se estimar a média e o desvio-padrão da população, usando-se esse termo em seu sentido técnico, ou seja, totalidade de dados do segmento que se pretende analisar (item 3.1.37 da NBR 14653-1:2019).
Na fase de levantamento de dados, deverá o avaliador observar as diretrizes previstas no item 7.4.3 da NBR 14653-3:2019. Os dados devem ser os mais semelhantes possíveis com o bem avaliando e, ainda, as informações colhidas devem ser contemporâneas.
O requisito de semelhança é calculado objetivamente a partir da comparação entre os fatores de cada item da amostra e os fatores específicos do bem avaliando (B.1.2.1 da NBR 14653-3:2019); além da análise de semelhança individualizada, é necessário que se faça a análise de semelhante entre o conjunto de fatores de homogeneização; esses fatores devem ser usados na forma de somatório (NBR 14653-3:2019, item 9.3.5, tabela 4, item 5).
O intervalo de admissibilidade para o teste de semelhança depende do tamanho da amostra e do grau de fundamentação que se busca atingir.
A NBR 14653-3:2019, em seu item 3.4, apresenta orientações para que o avaliador, ao coletar seus dados no mercado, atenda ao requisito de contemporaneidade. Pela norma, a contemporaneidade consiste na característica de dados coletados em período em que não houve variação significativa de valor no mercado imobiliário do qual fazem parte. Esse período é decidido pelo avaliador, conforme seu conhecimento do mercado; portanto, deve ser justificada no laudo. É recomendável que o avaliador informe o período em que os dados da amostra foram coletados.
As fontes de dados devem ser identificadas. A norma técnica admite as seguintes fontes: transações e ofertas.
Na hipótese de bens à venda, aplica-se previamente o fator elasticidade da oferta; após o ajuste feito a partir do fator elasticidade da oferta, inicia-se a fase de homogeneização do conjunto de dados a partir do somatório de fatores específicos de cada item da amostra, apurando-se um valor ajustado que servirá como base de cálculo para a incidência do somatório de fatores específicos do bem avaliando.
Em caráter excepcional, admitem-se opiniões ou estimativas de valor de profissionais, de funcionários de órgãos oficiais da área ou de agentes do setor imobiliário rural (item 7.4.3.10, alínea “c” da mesma norma técnica).
Influência da localização dos imóveis que compõem a amostra
A pesquisa de dados de mercado comparáveis deve ser feita na região onde se situa o bem; caso não seja possível encontrar elementos suficientes, poderá o avaliador informar se existem dados disponíveis em regiões próximas e, também, se a alteração na localização é capaz de gerar alteração no valor do bem (valor unitário do hectare). Caso sejam reunidos dados de diferentes localidades, o avaliador deverá esclarecer como esses dados serão tratados.
Na hipótese de tratamento de dados por fatores de homogeneização, deverá o avaliador apresentar a tabela de fatores de localização que entender serem os mais adequados, justificando-os; caso o avaliador decida aplicar fatores previamente tabelados, recomenda-se que cite a fonte. Os fatores de localização específicos utilizados para homogeneizar a amostra podem, ainda, ser calculados a partir das relações internas existentes na tabela de índices, os quais, por sua vez, podem ser calculados a partir das distâncias dos imóveis até o polo de referência.
Na hipótese de análise de dados por modelo de regressão linear, o avaliador deverá verificar se existe correlação entre a variável independente (distância do imóvel até determinado ponto de referência) e a variável dependente (valor unitário). Com frequência, percebe-se que imóveis rurais mais próximos do perímetro urbano possuem um valor unitário (R$/ha) maior do que aqueles imóveis mais distantes.
A prática revela que existe uma correlação negativa entre a distância do imóvel até o ponto de referência considerado mais valorizado, ou seja, quanto menor a distância (mais próximo) maior é o valor unitário; desse modo admite-se que a variável independente (distância) é relevante, pois ela é capaz de explicar a variação de preços (variável dependente).
Havendo uma correlação negativa (inversa) entre a distância (variável independente) e o valor unitário (variável dependente), admite-se a aplicação dessa variável em sua forma invertida (transformação). Desse modo, para distâncias maiores (denominadores maiores) o resultado será um quociente menor; por fim, a correlação entre esse quociente e o valor unitário passará a ser positiva (direta).
Todavia, cabe ao avaliador decidir se insistirá no uso dos dados e, em caso afirmativo, se a variável independente (distância) sofrerá, ou não, transformação, observando-se as diretrizes contidas no item A.2.2.1 da NBR 14653-3:2019.
Tamanho da amostra
A NBR 14653-3:2019 estabelece um número mínimo de dados; não há número máximo de dados. O número mínimo de observações feitas no mercado varia de acordo com o tratamento de dados escolhido pelo avaliador.
Caso o avaliador opte por analisar seus dados com o uso de fatores de homogeneização, o item 2 da Tabela 4 do item 9.3.5 da NBR 14653-3:2019 estabelece uma quantidade mínima de dados efetivamente utilizados, que varia de acordo com o grau de fundamentação que se pretende alcançar.
Caso o avaliador opte por analisar seus dados com o uso de modelo de regressão linear, o item 2 da Tabela 2 do item 9.3.1 da NBR 14653-3:2019 estabelece uma quantidade mínima de dados efetivamente utilizados, que varia de acordo com:
1) o grau de fundamentação que se pretende atingir; e,
2) com o número de variáveis independentes inseridas na análise, é necessário observar as orientações previstas naquela tabela.
Os exemplos disponibilizados se referem à avaliação de um terreno, sendo que:
1) no primeiro exemplo, foram considerados seis atributos e seus respectivos fatores para a homogeneização da amostra;
2) no segundo exemplo, foram considerados onze melhoramentos públicos, seus respectivos coeficientes e o fatores associados aos coeficientes.
Avaliação de imóvel urbano com tratamento de dados por modelo de regressão linear múltipla
Será apresentado, posteriormente, exemplo de avaliação de imóvel urbano pelo método comparativo direto de dados de mercado, no qual se aplicou o tratamento de dados por modelo de análise por regressão linear. Esse exemplo se refere à avaliação de um imóvel onde foram escolhidas duas variáveis independentes para explicar a alteração de preços na variável dependente: 1) área do terreno; e 2) área construída. A amostra desse exemplo, que será apresentado, contém 32 observações. Portanto, existem dados suficientes para se atingir o grau máximo de fundamentação.
Observe-se que a norma técnica faz menção a dados efetivamente utilizados; portanto, os pontos atípicos excluídos durante o saneamento não serão considerados como dados efetivamente utilizados; os outliers identificados nos resultados da regressão linear, caso sejam excluídos, também não serão considerados como dados efetivamente utilizados.
Os dados foram previamente ajustados pelo fator de fonte. Após, foram homogeneizados com base nos fatores de capacidade de uso do solo e de condições de acesso (escala de Mendes Sobrinho); foi incluído na análise, ainda, o fator de recursos hídricos, preenchendo-se assim os requisitos previstos nos itens B.3.1, B.3.2, B.3.3 e B.3.4 da NBR 14653-3:2019.
Preenchidos esses requisitos, o tamanho da amostra é suficiente para iniciarmos o tratamento de dados por fatores de homogeneização, em qualquer um dos três graus de fundamentação previstos na norma.
Caso o avaliador escolha analisar seus dados por modelo de regressão linear, o número mínimo de dados para cada um dos três graus de fundamentação é:
2 ⸱ (2 + 1) = 2 ⸱ (3) = 6, para o grau de fundamentação I;
3 ⸱ (2 + 1) = 3 ⸱ (3) = 9, para o grau de fundamentação II;
4 ⸱ (2 + 1) = 4 ⸱ (3) = 12, para o grau de fundamentação III;
Verifica-se, pois, que existe um número suficiente de dados tanto para a análise por fatores de homogeneização quanto para a análise por modelo de regressão linear.